quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Incompetência de uns, ganância de outros e o nosso amém


É de espantar qualquer pessoa, a aparência caótica das grandes cidades brasileiras, um verdadeiro caos com seus espigões brotando desordenadamente e suas intermináveis periferias e favelas construídas ao "deus-dará".

Antes de tudo quero reafirmar um princípio que cerca toda nossa atenção para com o tema: a habitação constitui-se direito humano básico. Afinal a Declaração Universal dos Direitos Humanos e nossa Constituição Federal, prevêem que todos têm direito a um padrão de vida adequado para sua saúde e bem-estar e de sua família, incluindo moradia. Sendo assim, considero um dever do Estado prover as condições para o pleno exercício desse direito fundamental.

Levando-se em conta que Barreiras sustenta imensa desigualdade social, com uma concentração de renda quase sem similares, devemos considerar que a uma enorme parcela da população não são dadas possibilidades de acesso ao mercado imobiliário.

Cada vez mais os trabalhadores, não conseguem atingir um nível de renda suficiente para adquirir ou construir um imóvel. Também é significativo o número de pessoas desempregadas ou jogadas no chamado mercado de trabalho informal, geralmente um eufemismo para subemprego ou mesmo para trabalho semi-escravo e degradante. Com isso é crescente também a demanda por habitação. Em Barreiras como um todo, para as faixas de população mais carentes, com baixa renda familiar, a demanda habitacional é superior a 20% de sua população (137.428 segundo o censo 2010).

A produção da imensa maioria das habitações ocupadas pelas faixas da população de baixa renda, até este momento, tem ocorrido através da iniciativa direta dos próprios usuários. Particularmente as famílias pobres e carentes, via de regra, têm acesso a moradias precárias através da produção espontânea (auto-ajuda ou ajuda - mútua), geralmente em áreas insalubres, ingrenes, através de ocupação.

Portanto, quando falamos em habitação popular estamos nos referindo a políticas e ações do poder público para assegurar a esse segmento acesso a moradias adequadas. Isso só pode se dar se não houver vinculação com a lógica do mercado que em geral ignora as necessidades dessa população excluída e também se o poder público oferecer financiamentos e subsídios.

Pesquisando o período da ditadura de Getúlio Vargas, já naquela época se construia casas “populares”, de má qualidade e que não levavam em consideração o tamanho das famílias, diga-se a verdade.

Incluímos ainda em nosso conceito de habitação popular o oferecimento de acesso aos serviços urbanos a essas pessoas de tal maneira a assegurar-lhes condições de vida saudáveis e dignas, transformando-os em verdadeiros cidadãos. Sem esse pressuposto, a moradia fica resumida à garantia de um teto para que essa população possa se reproduzir, mantendo, no entanto, as mesmas condições de exclusão e miséria em que se encontram.

Infelizmente a gestão municipal, “executivo e legislativo” não tem compromisso social, andam na contra mão da história. Foi aprovado no dia 19 de outubro de 2010, a lei n° 914/2010 que trata do parcelamento do uso do solo.

A referida lei altera os dispositivos da Lei Municipal nº 884/2009, de 29 de dezembro 2009 e 891/2010, de 08 de abril de 2010, e impõe futuro flagelo aos menos abonados.

Em seu artigo 1º, reduz as dimensões dos lotes de 360 m² para dimensões mínimas de até 60 m², com 05 metros mínimos de frente, sendo que 8% devem destinar-se a área verde e lazer.

Essa lei é totalmente preconceituosa, autoritária e segregacionista, uma vez que indica a quais localidades se aplicam.

Bairros mais pomposos e abastados ficaram de fora desse picadinho.

Em seu artigo 3º o texto autoriza o parcelamento dos lotes urbanos em 50% (cinquenta por cento) de sua área total, permanecendo com áreas nunca inferiores a 125 m², aplicável em todas as zonas de ocupação do solo da cidade, com exceção as localidades de Loteamento Morada Nobre, Vila Regina, Morada da Lua de Baixo, Renato Gonçalves, Jardim Imperial, Loteamento Aratu e Loteamento Bandeirante I.

A lei que interfere na vida de todos os cidadão foi discutida somente entre a Comissão de Planejamento da Câmara, representantes do setor imobiliário (especuladores), construção civil, técnicos da prefeitura e CREA.

Como se vê é lamentável e triste o ato de nossos políticos. Pior, só o nosso amém. Melhor seria oportunizar o convívio entre as diferentes classes sociais.

O poder público autoriza a favelização na cidade. Espero estar enganado, mas a médio e longo prazo Barreiras viverá o caos urbano dos grandes centros, fruto da ganância de uns e incompetência de outros.

Serão espigões ao alto, bairros nobres com serviços públicos de boa qualidade e grandes bolsões de miséria lá nos extremos rincões da cidade.

Reflitam.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Direito ao sonho

Causa-me espanto que algumas pessoas esperem que crianças se expressem “livremente”, sem que um clima anterior de discussão seja estabelecido. Sem que um repertório de leitura seja oferecido.

Mil dificuldades são usadas como argumento para justificar a falta de repertório e a precariedade de expressão das novas gerações no Brasil. As famílias estão cada vez mais pobres, o sistema escolar destroçado, os professores são mal preparados, mal remunerados, desmotivados para promover a leitura em seu mais amplo sentido.

Tudo isso é verdade. É verdade também que só com uma decidida vontade política esses problemas estruturais serão resolvidos. Acontece que, da mesma maneira que o baixo padrão aquisitivo não elimina a vontade de comer, também a ausência de estímulo oficial não impede a necessidade de sonhar, de falar, de comentar a realidade em que se vive.

O ideal seria que todas as famílias convivessem com livros e contassem histórias para suas crianças. O ideal seria também, que todas as manifestações artísticas fossem de fácil acesso à população e que essas fossem discutidas em seus lares. Conheço famílias cujos integrantes só conhecem na infância e na adolescência um único livro não escolar, “A Bíblia”, lida em sermões familiares, aberta a esmo em busca de conselhos nas horas mais difíceis.

Todas essas pessoas tornaram-se leitores no dia em que a vida lhes ofereceu esta oportunidade. Longe de mim querer discutir a importância religiosa ou literária da principal obra de referência da fé cristã. Não pretendo também abranger todo um universo de leitores a partir de casos específicos. Apenas arrisco uma hipótese, ressalvada qualquer pretensão: sendo a Bíblia – e, como ela, outros livros fundadores das grandes religiões, que a humanidade conhece, um grande elenco de histórias a respeito do sofrimento e dos limites da condição da condição humana, o fato de ela ser lida para crianças no seio da família e da comunidade religiosa, por si só, já estimula o gosto pela leitura. E mais, favorece a interpretação.

A principal vantagem de se aprender de pequeno, tudo que os mais velhos têm a ensinar sobre a beleza na vida e na arte, é que se cresce um adulto mais exigente. Esta é uma herança importante para se deixar aos filhos. Por que aceitar uma vida, além de dura, feia? Cidades destruídas pela ganância de uns e a incompetência de outros, escolas tediosas, serviços públicos de baixa qualidade, uma lista infindável de pequenos, médios e grandes desrespeitos ao cidadão? O adulto capaz de interpretar o que vê a sua volta e que considera o seu prazer e a beleza tão vitais como o seu direito à comida e à moradia, tem mais dificuldade de suportar este estado de coisa.

A insatisfação vem daí e é muito positiva. Da insatisfação surge o desejo de mudança, a esperança de mudar.

A família que forma um leitor, forma, também, alguém com mais chances de estar convencido do seu direito de usufruir do prazer da beleza. Não é pouca coisa.

Aqueles que se acostumam a aceitar passivamente tudo a sua volta, os que não têm acesso à fantasia, à interpretação, à esperança, correm um risco muito maior de se acomodarem e, o que é pior, serem destruídos. Estou convencido de que só se luta pelo que se conhece.

E pelo que se reconhece como direito seu. É difícil para alguém, que nunca teve direito a comida, diversão e arte, compreender a importância de lutar por essas coisas. A tendência das pessoas é garantir apenas o essencial à sobrevivência quando elas não tem uma memória de prazeres mais abstratos. O direito a sonhar parece supérfluo aqueles que não foram ensinados a lidar com a fantasia e o lúdico. Muito é triste um mundo em que tantos são privados desse prazer fundamental.

Se não fosse a esperança de, um dia, ver esta situação modificada, a vida se tornaria insuportável.

Não acredito que a leitura, no seu sentido mais amplo, seja uma garantia de felicidade ou de sucesso. É impossível para qualquer família, para qualquer adulto responsável por uma criança, ter controle sobre as circunstâncias do futuro. O que eleva e o que abate um ser humano em sua trajetória não é previsível, pertence a esfera do imponderável. Por este motivo, escrevi acima que a vida é muito dura, sempre, mas um ser humano, capaz de refletir o prazer e a beleza, terá mais chances de encontrá-los em seu caminho.

Publicado em outubro de 1999 em O Original - Informativo do Sindicato dos Trabalhadores em Editoras de Livros e Publicações Culturais do Estado de São Paulo

Cala Boca Já Morreu...

Por que escrever, editar e divulgar um blog? Porque nos consideramos artistas, criadores, agitadores de um novo movimento, mesmo que em espaço reduzido e delimitado?  Até gostaria de estar fundando um movimento estético, mas para isso, precisaria de uma geração dispostas a romper com uma vigência, mas… quem tem consciência para ter coragem, quem vai romper com os padrões que se ruminam tempo após tempo, o mais do mesmo?!, ainda mais em tempos de poéticas tão isoladas, dispersas, e, muitas vezes, carentes de um projeto consistente… em tempos onde os aparelhos ideológicos do estado e a falsa democratização massificada das mídias diluem e escondem os discursos autoritários… Quem?!

Essa situação é nossa angústia: não saber ao certo quem é o inimigo, não saber a quem atacar, não saber de onde vem o tiro.
Contudo, essa angústia não elimina uma necessidade básica e raramente suprimida de todo ser-humano: a expressão e a comunicação Libertária: A Contra-comunicação.

Na ânsia ociosa dessa necessidade, busca-se o melhor meio de supri-la, e este é sem dúvida é a Arte Digital. A linguagem poética é a mais libertária forma de expressão, a crítica pode até tentar cerceá-la, cercando de teorias, regras e classificações, padrões, hierarquias e cânones.  Mas, é justamente quebrando as regras que a ela impõe que a arte sobrevive, se renova e (se) reinventa. Por meio da arte, pode-se recriar o universo, montar uma realidade paralela toda feita de signo. A ‘artinventiva’ é o verdadeiro espaço de democratização da linguagem, onde pode-se criar a sua própria negando todas as regras técnicas, gramaticais, morais, ideológicas.  Negando a própria arte, deslendo e desconstruindo a tradição.

A arte transcende. A arte se subverte e se recria numa seqüência histórica auto remissiva de valores interpretantes… a arte é uma arma poderosa e perigosa.

Ela é perigosa, pois, produzindo-a, encontramos, enfim, o inimigo contra o qual lutar: o tão “admirável mundo novo” o "Big Brother" que é o padrão, a robotização, a maquinização, a tarefa ideológica da homogeneização. Tudo aquilo que nos cala e nos nega altoridade , que nos situa no mundo como meros fantoches ouvintes/receptores e nunca como falantes/produtores. Nós ouvimos (a televisão, a música no rádio, o jornal, a autoridade e até a Voz do Brasil! rsrs) e nunca somos ouvidos, como se não tivéssemos nada a dizer, assim, nos relegam à pior forma de isolamento: aquele, entre um mar de vozes, onde a sua se dilui, se perde e não é ouvida.

A expressão artística consciente, que se inscreve historicamente, que traduz para sua linguagem os sinais de seu tempo e de um passado que pretende ler e iluminar em face de um projeto do presente que se projete para o futuro, como roteiro de uma nova história, põe em cheque toda forma de autoritarismo ideológico e estético dos meios de comunicação da suposta era das mídias democráticas. A representação do discursos e padrões por meio da metalinguagem, do signo icônico, que interpreta, critica e evidencia sua vacilação, põe em colapso todos os padrões, toda a certeza, criando linguagem e estéticas próprias.

A produção artística é contra-poder, contra comunicação, é libertação.

Na aldeia de pedra que semeia ferro, somos sós, somos todos inelutavelmente sós, o sujeito pós?-moderno é terrivelmente só (ou você nunca sentiu uma “punhalada”? Ou nunca esteve fora da roda, “como um indigente”?). O romance, como gênero literário da modernidade, éuma prova disso: “A origem da poesia é o individuo isolado, que não pode mais falar exemplarmente sobre suas preocupações principais e que não recebe apoio nem sabe dá-los”.

A escrita é uma experiência solitária. Devemos, por tanto, guardar o que escrevemos em um baú ou queimar tudo?

Acredito que não, acredito que necessitamos da expressão e comunicação Libertária, sem nos preocuparmos com juízos de valor, sem nos preocuparmos se agradamos ou desagradamos, sem nos preocuparmos se ferimos morais ou convicções quaisquer que sejam, sem nos preocuparmos com a crítica, até porque, para haver crítica, é preciso que alguém ouça nosso grito. Melhor gritar e ser ouvido, ainda que desagradando, incomodando, do que permanecer eunucamente mudo e servil.

Não tenho grandes pretensões, só quero cantar, pouco importa se saio do tom ( o essencial é querer cantar), pois é exatamente como disse Oscar Wilde: “Todos estamos na sarjeta, mas alguns de nós preferem olhar as estrelas”.

Assim, te convido ( você que estás se dispondo a ler isto neste momento) a fazer o mesmo.  Somos todos cantores, basta ter pulmões e querer cantar.

Canta, Berra, Escarra, Vomita, Esporra, Regurgita tuas neuroses…

Cala Boca Já Morreu!!!

Texto escrito em 25/03/1999
Luís Carlos